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TENENTE FERNANDO – 70 ANOS DESAPARECIDO (2)
24 de  abril de 2014 | Autor : 4 | Fonte : 4


Porto Velho, 1945. O Território tem seu primeiro escândalo

Lúcio Albuquerque
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Consultor: Abnael Machado de Lima, professor, historiador, membro da Academia de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Rondônia


Criado pelo Dec/Lei 5.812/13.9.1943, o Território Federal do Guaporé (*), composto por terras dos estados do Amazonas e de Mato Grosso, completara 18 meses de instalação (janeiro de 1944), contando dois municípios, Porto Velho (ex-AM) a capital, e Guajará-Mirim (ex-MT), e já enfrentava em julho de 1945 seu primeiro grande escândalo – um escândalo que se transformou em várias versões e 70 anos depois não foi esclarecido, o sumiço do tenente Fernando Gomes de Oliveira.

 
Jovem declama em honra a Vargas (paletó branco)
na escadaria do Cine Teatro Resky (Foto cedida pelo
 historiador Esron Penha de Menezes ao autor)


O presidente Getúlio Vargas, em 1940, atendendo convite do superintendente da Madeira-Mamoré Aluízio Pinheiro Ferreira,  com uma comitiva de ministros, assessores e jornalistas deixou Manaus, onde pronunciara o “Discurso do Rio Amazonas” e veio a Porto Velho, para ficar por três horas, mas permaneceu do dia 10 a 12 de outubro, conheceu a cidade, e até visitou o trecho da rodovia “Amazonas/Mato Grosso”, à altura do KM 8 da atual BR-364 sentido sul), obra que vinha sendo tocada a mando do próprio Aluízio.

Aluízio Ferreira não era só o primeiro brasileiro administrador da ferrovia. Para usar uma expressão generalizante, conforme diziam os daquele tempo, literalmente “aqui ele casava e batizava”. Sua palavra era a lei, e são muitos os casos e causos contados sobre essa figura a quem Rondônia deve muito, mas que precisa ser analisado dentro de dois focos distintos, “o homem” e “o mito”.

Desde 1912, quando foi inaugurada a ferrovia e houve a queda da venda da borracha, Porto Velho, ainda município amazonense, tivera reduzida sua atividade econômica. A criação Território dera à região um novo oxigênio, retomando o desenvolvimento e aumentara sua população, fruto do Acordo de Washington que garantiu meios para o Brasil explorar a borracha amazônica necessária para abastecer as tropas Aliadas na II Guerra Mundial, depois dos japoneses terem conquistado os seringais de cultivo no Extremo Oriente.
A cidade ganhara sua segunda agência bancária, a do Banco da Borracha (atual Banco da Amazônia) – a primeira agência fora do Banco do Brasil, e o Segundo Ciclo da Borracha, de curta duração porque acabou quando os japoneses se renderam em agosto de 1945, serviu para dar outra feição aos dois municípios de então.

Porto Velho e Guajará-Mirim tinham como grande fonte econômica o extrativismo vegetal e a ferrovia Madeira-Mamoré. Àquela altura aviões da empresa Condor – depois Cruzeiro do Sul, já incluíam as duas cidades em suas rotas, com seus hidros descendo nos rios Madeira e Mamoré.

Nas duas cidades ainda não havia uma efervescência política, até mesmo porque os partidos estavam proibidos desde a Revolução de 1930, apesar de algumas lideranças guajaramirenses não terem ainda absorvido bem o fato de o Território ter sido feito com partes de terras do Amazonas e de Mato Grosso, contrariando o documento encaminhado pelos líderes da “Pérola do Mamoré” ao presidente da República, em 1937, reivindicando a criação de um Território só com áreas matogrossenses e a capital em Guajará-Mirim. O presidente determinou aos órgãos ministeriais a análise e a emissão de um parecer sobre a proposta encabeçada pelo líder Paulo Saldanha.


 
Aluízio Ferreira fora comandante do Forte de Óbidos na Revolução de 1924  (em razão de seu grupo ter perdido, fugiu e homiziou-se na região do Rio Guaporé e, depois, foi reintegrado ao Exército) e o primeiro brasileiro a administrar a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.
Numa época em que praticamente não havia Justiça local, os governadores e empresários cometiam arbitrariedades e desmandos, porque o Tribunal funcionava no Rio de Janeiro, muito distante haja vista não haver meio de comunicação afora o
telégrafo ou o avião que passava, talvez, uma vez por semana. Não havia rádio local e o único jornal era o Alto Madeira, criado em 1917 sucedendo O Município, de 1915, mas que em 1936 o AM foi adquirido pelo magnata das comunicações Assis Chateaubriand.
Naquele ano de 1945 o contingente do Exército era representado pela 3ª Companhia de Fronteiras, cujo comandante era o capitão Antonio Carneiro de Albuquerque Maranhão, e o capitão Ênio Pinheiro ,parente próximo do governador Aluízio Ferreira, era comandante da 2ª Companhia rodoviária Independente.
Em Porto Velho a luz elétrica era desligada às 23 horas. Era comum as famílias ficarem conversando nas calçadas, h, funcionavam alguns bordéis,  e os notívagos e os que gostavam de conversar se encontravam nos clíperes, pequenos bares localizados no meio da Avenida Sete de Setembro.


 
Lazer como se conhece atualmente praticamente não existia. Quem tinha um aparelho de rádio vivia assediado pelos que não tinham para saber o que estava acontecendo no mundo, e a recepção do sinal nos aparelhos era muito dificultada pela variação das ondas que conduziam a voz dos locutores, mas todos queriam saber como estava a cotação da borracha ou como andava a Segunda Guerra Mundial.
Aos domingos a grande pedida era ir a um cinema ou, para os jovens, ficar circulando nas calçadas da Praça Rondon, no exercício milenar da paquera. Os clubes eram poucos, mas muito ativos. O mais cotado era o Internacional (depois Ferroviário) onde a festa exigia traje passeio e só se começava a dançar depois que o coronel Aluízio Ferreira chegava e abria a noitada.

(*) O Território foi criado com quatro municípios: Porto Velho, Guajará-Mirim, Santo Antonio e Lábrea. Em 1945 Lábrea havia sido devolvido ao Amazonas e Santo antonio foi absorvido como bairro de Porto Velho.

Amanhã: A selva engole o oficial, caçando um inambu


 
Lúcio Albuquerque
Jornalista, Escritor e Membro da Acler
 

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